A odisséia continua…

Imaginemos um computador capaz de controlar uma nave espacial, com habilidades para jogar xadrez e manter diálogos com a tripulação. Essa ficção possível em nossas mentes foi muito bem realizada em “2001 – Uma Odisséia no Espaço”, de Stanley Kubrick, que mostra o futuro a partir da transformação simbólica do macaco em homem, quando aquele utiliza um osso como arma. A interação do homem com o mundo deixa de ser direta e passa a ser mediada por pedras lascadas, linguagens, símbolos, caravelas, aviões e computadores. O ser humano amplifica suas habilidades.

Guardadas as limitações da linguagem fílmica, o livro Educação tecnológica: desafios e perspectivas, lançado pela Cortez Editora, discute, por uma visão interdisciplinar, as relações entre tecnologia e educação. Quatro profissionais da educação produziram ensaios fundamentados na história e na filosofia, dentro de contextos sociais e éticos.

A educadora Mírian Paura Sabrosa Zippin Grinspun, professora titular da Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, define, no primeiro capítulo, o que devemos entender por educação tecnológica e ressalta a primazia da autonomia humana: “…o que se pretende alcançar é que o indivíduo seja capaz de obter conhecimentos, construí-los através de uma atitude reflexiva e questionadora sobre os mesmos”.

Nas considerações finais do livro, organizado por Grinspun, o texto é enfático para rejeitar algumas concepções do termo. “Educação tecnológica, no contexto escolar, não é a preparação para o ensino técnico e profissional, não é o domínio de técnicas para a utilização da tecnologia mais usada, como os computadores nas escolas, não é aprender um receituário pedagógico/tecnológico sobre como defrontar-se com as principais tecnologias dentro ou fora da escola…”.

O livro conta ainda com a participação de Antonio Maurício Castanheira das Neves, livre-docente em psicologia social e institucional pela Universidade Gama Filho, e de Tereza Maria Fachada Levy Cardoso, doutora em história social. No capítulo “Ética, tecnologia e sociedade”, Neves identifica o contexto em que a tecnologia vai se desenvolver e os princípios éticos que a conduzirão. Em “Sociedade e desenvolvimento tecnológico: uma abordagem histórica”, Cardoso retrata uma história da tecnologia considerando alguns aspectos fundamentais para se pensar o tema.

Os textos são ricos em análises de conceitos e dignos pelas argumentações e questões para reflexão. Anna Maria Moog Rodrigues, doutora em filosofia e professora titular da Universidade Gama Filho, questiona, no segundo capítulo, sobre a relação entre o homem e a tecnologia: “Estará, então, a tecnologia a serviço de uns em prejuízo de outros, isto é, consistirá, como obra da criação do homem, em instrumento de escravização de muitos por alguns poucos? Ou então, terá o homem, tal como o “aprendiz de feiticeiro”, liberado no mundo um processo que se tornou incontrolável e autônomo?”.

A dimensão da educação está presente em todos os movimentos dos textos. A tecnologia não é apresentada, simplesmente, como vilã na relação com o homem. Ela assume o centro de um debate reflexivo sobre o seu domínio e predomínio na nossa sociedade. Nesse sentido, a ética assume importância fundamental na compreensão de um conhecimento da ação. Talvez um sinal de alerta para o “aprendiz de feiticeiro” dentro de nós. Ou até mesmo uma precaução, que o computador HAL 9000, do filme de Kubrick, ilustra muito bem: o cérebro eletrônico torna-se tirano e mata tripulantes. A traição é da máquina ou do homem?


Livro: Educação tecnológica: desafios e perspectivas
Autor(es): Míriam Zippin Grinspun (org.), Anna Maria Moog Rodrigues, Antonio Maurício Castanheira das Neves, Mírian Zippin Grispun e Tereza Fachada Levy Cardoso
Editora: Cortez
Páginas: 232
COMO CITAR ESTE CONTEÚDO:
MENEZES, E. T. A odisséia continua…. EducaBrasil. São Paulo: Midiamix Editora, 1999. Disponível em <https://educabrasil.com.br/a-odisseia-continua/>. Acesso em 29 mar. 2024.

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