Panorama do ensino da arte

Arte, história e ensino são áreas de estudo distintas e ao mesmo tempo interligadas por um ponto comum: o homem. “É ele quem faz a história, a arte e transmite seus conhecimentos por meio do ensino formal ou informal, perfazendo o caminho de um processo evolutivo e progressivo denominado educação”. É assim que a pesquisadora e artista plástica Dulce Osinski entende os pressupostos da história do ensino da arte. Ela investigou a trajetória do pensamento educativo em arte, abordando diversas perspectivas que se iniciam com a escola da tradição e passa pelas academias de influência clássica e renascentista, chegando às tendências contemporâneas. O resultado de sua pesquisa está no livro Arte, História e Ensino – uma trajetória, que faz parte da coleção “Questões da Nossa Época”, da Cortez Editora, voltada para a formação e informação de estudantes, professores e pesquisadores e que aborda problemas da cultura contemporânea em textos curtos sob o formato de “pocket book”.

Dulce Osinski, professora na Universidade Federal do Paraná, divide a evolução do ensino da arte em oito grandes períodos, correspondentes aos capítulos de seu livro. Assim, procura detectar as influências e procedimentos que permitiram a construção de uma sistemática no ensino da arte através de um tempo cronológico. Os momento históricos mais significativos são as balizas de seu estudo, desde as cavernas pré-históricas até a contemporaneidade. Para compreender o sentido dessa evolução, a autora buscou em Edmund Feldman, Arnold Hauser e Rainer Wick seus principais parâmetros teóricos. John Dewy, Herbert Read, Viktor Lowenfeld e Elliot Eisner também fazem parte de sua bibliografia.

Arte, História e Ensino tem um objetivo bem claro: lançar sementes para pesquisas nesta área e, sobretudo, auxiliar arte-educadores e estudantes de arte na compreensão de sua própria prática pedagógica. Nesse sentido, “A escola da tradição”, primeira parte do livro, mostra como o ensino da arte de forma sistematizada é algo relativamente recente na história da humanidade. Os conhecimentos artísticos, segundo a autora, eram transmitidos pela tradição, “situação que perdurou desde o período Paleolítico, palco das primeiras manifestações artísticas, até o Renascimento”. A partir desta constatação, Dulce Osinski mostra o caminho percorrido pela a arte, cujas origens se confundem com as do próprio homem e inicia quando a figura do artista se confundia com a de um curandeiro, sacerdote ou mágico. A técnica elaborada das pinturas paleolíticas, o caráter utilitarista dos produtos artísticos no Neolítico e a especilização do trabalho, na figura do artista-artesão, durante o processo de urbanização são aspectos desenvolvidos pela autora. Também são investigadas a arte egípcia, os conceitos culturais greco-romanos e o espírito da produção artística, que culminam com a formação de “lojas” de artistas. Além disso, Osinski aborda o surgimento da burguesia urbana como estimuladora da formação do sistema de corporações e guildas que permanecem até a consolidação do pensamento renascentista.

Os dois capítulos seguintes, “A arte o conhecimento científico” e “As academias e o surgimento do Neoclassicismo”, consolidam a idéia de “laicização” da arte, quando o homem, “afastando-se progressivamente dos dogmas religiosos, descobriu o mundo e colocou-se no centro das preocupações investigativas”. Passam então a figurar no cenário artístico o conceito de propriedade intelectual, a associação dos artistas com os mecenas e a combinação de elementos de prática pedagógica das oficinas de arte com o conhecimento humanista. A idéia de “gênio”, um ser dotado de uma força criativa inata, também é dessa época, representada, inicialmente, por artistas como Leonardo da Vinci, Rafael e Michelangelo. Mas são as academias, segundo a autora, que vão desempenhar papel importante na vida artística dos dois séculos seguintes. Osinski revisita o surgimento das academias e mostra sua enorme influência no âmbito educacional. A partir daí surge a preocupação com o ensino da arte no currículo das escolas e a ampliação dos museus de arte.

O quinto e o sexto capítulo levantam questões sobre o ensino da arte já num ambiente econômico de industrialização. O livro chama a tenção para um novo sistema produtivo onde artesãos tornam-se incapazes de fazer frente à concorrência das máquinas e forma um abismo entre trabalho artesanal e produtos fabricados em série. Nesse contexto, o ensino da arte tenta integrar os aspectos artísticos e industriais, problemática que, para Osinski, vai orientar o ensino para uma concepção utilitarista. Mas, ao mesmo tempo, são essas novas concepções que teriam levado, no campo da arte, aos movimento de vanguarda, que “liberaram de vez o artista de cânones preestabelecidos, valorizando a expressão individual”. Os estudos de psicologia infantil levam, nesse período, a uma inovação do pensamento pedagógico, cujo representante maior é Piaget. A autora explica que, a partir daí, os modelos de ensino da arte, baseados nos princípios gregos de beleza ideal e de geometria, são revistos e faz surgir, em fins do século XIX, o Movimento de Educação Artística. Essa tendência reformista traz várias obras pedagógicas dirigidas ao ensino da arte, cujos objetivos são pincelados no decorrer do livro.

Por fim, os dois últimos capítulos dedicam-se, respectivamente, à “educação pela arte” e às tendências contemporâneas. Osinski explica que a banalização da livre expressão e o despreparo dos professores geraram um decréscimo do nível de qualidade das atividades pedagógicas em arte e até implicaram em desprestígio desta disciplina frente às demais do currículo escolar. Mas o surgimento de novas teorias a respeito do funcionamento do cérebro, como a estudada por Howard Gardner sobre inteligências múltiplas, “contribuiram para que a questão da expressão artística fosse vista sob novas luzes”. A pesquisadora analisa, então, novas idéias e organizações nascidas, como o “Basic Design Movement”, o DBAE – Discipline Based Art Education (arte-educação como disciplina) e o Movimento Muralista Mexicano.

Longe de querer dar um ponto final sobre idéias e conceitos existentes na história do ensino da arte, o livro Arte, História e Ensino mostra que são muitas as facetas que têm se dividido os debates em torno desta questão. É justamente esse caráter que Dulce Osinski ressalta. “A compreensão de que a manifestação artística é multifacetada, não possuindo valores hierárquicos condicionados ao seu caráter mais erudito ou popular, tem sido de grande importância para que se vislumbre, para a arte-educação, novos caminhos mais afinados com as realidades socioculturais das diferentes comunidades.”


Livro: Arte, História e Ensino – uma trajetória
Autor(es): Dulce Osinski
Editora: Cortez
Páginas: 119
COMO CITAR ESTE CONTEÚDO:
MENEZES, E. T. Panorama do ensino da arte. EducaBrasil. São Paulo: Midiamix Editora, 2001. Disponível em <https://educabrasil.com.br/panorama-do-ensino-da-arte/>. Acesso em 29 mar. 2024.

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